domingo, 7 de agosto de 2011

Persistência


A imagem de aridez e penúria de uma paisagem erma pode ensinar muito sobre o povo que nela habita. O carater dessa gente é diretamente associado às benesses e privações que sua terra natal lhes impõe. São anos de aprendizgem, onde o hábito do cotidiano ensina a pratica e a observância das horas de ócio teoriza uma experiência de séculos. Essas primeiras palavras parecem querer reviver os teoremas do determinismo geográfico herdados do século XIX para explicar algo, na verdade, inacessível a qualidade mineral do solo.
Homens e mulheres dependentes de um ambiente cujas condições de sobrevivência parecem querer expurgár-los. Eles possuem todas as idades, estágios de vida atestados pela brandura das maçãs do rosto visível nas crianças ou pelos sulcos e relevos que dão uma nova textura a pele anciã. Um semblante taciturno que habita as mais altas altitudes do continente americano, um ar anônimo contrastante com as cores e desenhos das costuras dos tecidos trajados por eles. Estes homens, me parece, passaram de discipulos à mestres do terreno abaixo de seus pés e voltam a ela como os filhos que regressam aos braços de sua mãe no derradeiro suspiro. O Boliviano é antes de tudo um forte. Parafraseio Euclides da Cunha porque este escreveu sobre a raça da qual minha mãe pertence, referência sempre clara e viva na minha mente enquanto me descolava pelas paragens deste país.
A pintura Persistência (1993) de Fernando Peñaranda formalizou o conceito levantado já nas ruas de La Paz e estradas do Altiplano, o povo da montanhas é feito de pedra e poeira, - esta imiscuido a terra - dela retira seu alimento e com ela constrói seu abrigo. Caminhando, ingerido pela multidão, percebe-se como as mulheres acocoradas ao chão se confundem com o terreno; as cholas são como escultura vivas inertes e os homens tem a cor de suas pegadas. A persistência retratada na linguagem do pintor paceño versa exatamente sobre esse tema; as formas sinuosas daqueles cerros de composição marrom, panorama desértico dos Andes, assemelham-se as linhas do corpo dos sobreviventes a seu sopé. Em uma das salas de decoração colonial do Museu Nacional de Artes da Bolívia, meu estado de contemplação transformou-se em compreensão à relação ínitma deste povo com sua terra e atentei para a luta destes aferrada ao único bem que séculos de humilhação não conseguiram furtar.

Um comentário:

Luara disse...

às vezes quando te leio parece que falta pouco para meus pés alcançarem os ligares por onde andou.