sábado, 20 de fevereiro de 2010

Apologia à memória

O uníca meio que pode atestar a minha existência é o conteúdo da minha memória, pois é dentro deste caldeirão de reminiscências que se encontram o material ou a documentação necessárias ao processo de verificabilidade desta tese: a de que eu vivi antes do tempo presente. Procedimento empírico simples, mas que demanda dedicação exclusiva. Absortos neste pensamento, criamos a mesma imagem em nossas mentes - sem um sustentáculo efetivo à vida terrena, somos somente corpos a flutuar. O passado então, para mim, não é nada mais que uma âncora ou um porto seguro; o primeiro refúgio de nossa identidade.
Todo este prólogo sobre método científico me serve para penetrar no cerne da questão principal deste texto, que me ficou inculcada estes dias. À narrativa de vivência de qualquer indivíduo pertencem outros tantos seres animados, pessoas que num momento ou outro cruzaram nosssa trajetória e a marcaram de alguma forma. Às vezes indelévelmente outras tantas em algum episódio efêmero qualquer. O que me importa neste processo de investigação não é o caráter qualitativo desta marca, mas o resgate desta longa duração (não tão longa para alguns), a reconstituição deste caminho sinuoso e incerto, sabe? Infelizmente, não são todos os personagens desta estória que conseguirão deixar vestígios vísiveis em nossa lembraça. Verdade cruel ou máxima inegável, em sua maioria seriam como se nunca tivessem existido. Então, a que parte do seu mundo eu pertenço? Àquela premente em sua memória ou à relegada ao esquecimento?
O que me conforta em lembrar das pessoas é saber que elas me esquecerão. Pois - passo para a perspectiva pessoal - não existe qualquer preocupação revolvendo meu âmago que se entregue a questão da minha diferença ou não na memória alheia. Desfruto sim, da sina de ser olvidado de outrem enquanto sempre me irei recordar de vc.

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