sábado, 1 de fevereiro de 2014

Catar coisas inúteis garante a soberania do Ser. Garante a soberania de Ser mais do que Ter.

Tem mais presença em mim o que me falta.

Manoel de Barros


Tenho apenas aquilo que perdi, pois é por perder que finalmente vejo que tem ser, vejo que está dentro de mim. E como tê-la dentro se estas ai, sedutora e reluzente, fora de mim? A vejo, sobressaltado, seus gestos de nanquim como bem vive sem mim. Entretanto, quem esta ai fora já não é quem tenho aqui dentro, bem diferente, como um simulacro de quem ainda tenho presente. Quase apagada, nada se compara ao que eu guardo como joia rara. Ainda assim, vejo o quão difícil é sustentar-se diante de um espelho, vago incerto como um peixe fora do aquário diante do que não tenho por perto. Não é mais ter, é apenas ser. Me sinto um ventríloquo balbuciando palavras que não são minhas, pois a quem quero enganar? A minha presença é aquilo que me mais falta e eu não passo de um velho a me lamuriar. É que esqueço o quão grande eu era quando não me apegava ao ter, mas apenas ao ser, ser dessa infância que se passou quando eu ainda olhava para o chão a cata de tocos de galhos de árvore secos e quebradiços.

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