domingo, 9 de agosto de 2009

Eu, um Lobo da estepe

Um caminho que satisfaça a um homem não é fácil de encontrar, mas um que satisfaça a muitos é praticamente impossível. Visto que todos temos que lidar com essas muitas vozes que estão em nossa mente e que possuem a precisa certeza de que sabem como se virar; de que são as donas da verdade e de que em absoluto cogitam a idéia de estarem erradas. Entretanto a maioria das pessoas consegue dar um sentido a vida ou pelo menos não estanca na encruzilhada, pois é exatamente nesse labirinto de portas ou saídas que me detive. Longe de ser um mero obstáculo, esse trabalho hercúleo se coloca como uma das grandes desculpas para o desgosto que nutro pela vida. Como em um grande drama, temos no palco forças divergentes que se engalfinham para tomar posse da liderança/comando e nesse eterno embate (21 anos de guerra aproximadamente) colocam em risco a minha relação com o mundo real, usufruem dos prazeres da discórdia e compromente a minha estrutura perante a sociedade. O resultado final é esta criatura "dual e discordante" da qual vos fala - ser de péssimo humor e de franqueza peçonhenta - que não sabe lidar com outros homens ou simplesmente se furta de cultivar dependências.
Trataresmos pois dessas facetas subcutâneas que perfazem o espírito deste animal/homem já muito fragilizado. Ignorando a multiplicidade dos eu's que me arrematam, pretenderei dar ênfase a apenas dois deles - o homem e o lobo - frente e anverso da mesma moeda, eles criaram um grande obstáculo para a continuidade da minha existência. De particularização díficil, pois cada um deles se subdividem em novos e específicos entes, eles se destacam na turba de vozes tentando impor suas vontades e objeções, logo descrevemos uma convivência aonde não existe o diálogo, unicamente o escárnio e a hostilidade. Nesse terreno o homem aparece como um nobre côrtes e amável, disposto a expressar seus ideais e receios, dedicado as artes e as amizades, que abomina a malvadeza e o solipsismo e ama, acima de tudo, aos outros homens. Quanto ao lobo, esta fera ímproba e desrespeitosa, prefere o eremitismo, a razão e como fator último de deliberação o instinto, possue impulsos incontroláveis que lhe tornam imprevisível e perigo, não apenas a si mesmo, mas sobretudo aos outros e, em contraposição ao homem, ama com fervor a natureza, seu habitat. Como controlar duas entidade tão discrepantes dentro de um corpo só? Se antes ambas coagissem suas ordens em benefício mútuo... Mas não, "nele o homem e o lobo não caminhavam juntos, nem sequer se ajudavam reciprocamente, mas permaneciam em contínua e mortal inimizade e um vivia apenas para causar dano ao outro, e quando há dois inimigos mortais num mesmo sangue e na mesma alma, então a vida é uma desgraça."
Desta forma, assumir a direção de tal espetáculo era improvável, mesmo para o mais destemido ou destro maestro/diretor. Desta maneira seriam explicados os meus atos falhos; em circunstâncias assim lançaria mão desavergonhadamente da esquizofrenia para me explicar. E ah, a grande revelação: se fujo dos lugares e das pessoas é para mormente, uivar para a lua em trevas que tanto me atrai. Claro, vcs não acreditariam, pois já domaram este selvagem interior a muito tempo ou se quer deixaram-no viver - mas quanto a mim, o que poderia fazer se ele vive e cresce a cada dia dentro do meu âmago? Me matar? Me controlar? Ou me isolar? Não, nada disso, segundo Hesse, eu deveria aprender a ouvir amúsica além da algaravia e rir-me de todo o resto.

2 comentários:

Mariana disse...

Se existe um motivo pelo qual a obra de Hermann Hesse é eterna, é que é um texto pra se entender, mas também pra se sentir. Todos os fãs incondicionais desse autor tem isso em comum, eles conseguem viver na angústia do seu personagem. A voz de Harry Haller se confunde com a voz dentro de sua mente. Os urros de lobo aterrorizam, mas confortam ao dizer que a angústia não é única. Eu só tenho dificuldade mesmo em ver a tal da redenção de que o Hesse fala no Epílogo, pq ao ler Hesse eu sempre vou me perder nesse desencanto tão familiar de Harry Haller!

Natália Gomes Ferreira disse...

O jeito é querer, só querer e ir pra onde o querer te levar. Fazer o quê?

Tomo cuidado sempre.