sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Pegadas na areia.

"“Soy tan feliz”, dice Sonia apoyando la mejilla en el pecho de Roland adormilado. “No lo digas”, murmura Roland, “uno siempre piensa que es una amabilidad”. “¿No me crees?”, ríe Sonia. “Sí, pero no lo digas ahora. Fumemos.” Tantea en la mesa baja hasta encontrar cigarrillos, pone uno en los labios de Sonia, acerca el suyo, los enciende al mismo tiempo. Se miran apenas, soñolientos, y Roland agita el fósforo y lo posa en la mesa donde en alguna parte hay un cenicero. Sonia es la primera en adormecerse y él le quita muy despacio el cigarrillo de la boca, lo junta con el suyo y los abandona en la mesa, resbalando contra Sonia en un sueño pesado y sin imágenes. El pañuelo de gasa arde sin llama al borde del cenicero, chamuscándose lentamente, cae sobre la alfombra junto al montón de ropas y una copa de coñac."
Todos los fuegos el fuego, Julio Cortazar.

Rescostado em um dos bancos do lado da janela, enfurnado ao fundo do coletivo, repousava minha cabeça contra o vidro. Sua qualidade fosca parecia acentuar minha indiferença em relação ao mundo externo. Estava cansado e parecia compartilhar com o resto dos passageiros o pesar daquele fim de tarde com excessão de um casal que parecia estar alheio em seu mundo de carícias e risos contidos localizado dois bancos mais a frente. Era fins de novembro e o calor daquela primavera parecia torrar as têmporas dos passantes a quem o autobus deixava para trás, porém eis que uma fisionomia se desgarra das outras e minha mirada atordada se desvia dos letreiros coloridos e chamativos das ruas do centro e se concentra naquele semblante de sombrancelhas arqueadas e bem feitas. Minha desetenção a registrou de relance, mas minha memória jamais abandonou ao olvido aquele olhar mediterrânico. Foi impulsivo - mas em qualquer um dos outros mundo eu teria agido da mesma maneira - saltei de meu acento e dei sinal, quebravamos a esquina e seu perfil aos poucos tornava-se indivisível. Queria apenas alcança-la, fazê-la crer que aquele encontro era casual e involuntário e talvez arrancar-lhe um sorriso com tamanha desfaçatez. Quiçás não me reconhecerias ou pior, meu sobressaltado movimento seria fruto de um tolo engano. Vacilo ao pronunciar seu nome, mas é seu rosto que se volta a minha direção com uma leve surpresa nos lábios. Aquele momento não nos reserva tempo, seu atraso para algum jantar à algumas quadras além dita o ritmo do ocaso. Queria revirar o passado e reviver as sendas deixadas por reminicências tão antigas, mas sua indagação educada ao relógio me nega essa oportunidade. Era verdade e eu já sabia, os desfechos são definitivos e o passar dos anos apenas confirmam as palavras já ditas.

terça-feira, 31 de julho de 2012

Pornopoética, Fragmento 3

Desfazendo-se na massa homogenea de uma corrente contínua, uma singela figura feminina de lenço envolto ao pescoço e longos cabelos encaracolados e seu par irropem o aparente equilibrio e mecânica daquelas engrenagens, progridem através da plataforma e se refugiam em seu último banco, quase isolados, porém ainda às vistas de quem não interrompe o passo. Ignorados, passam as indas e vindas dos trens conversando sobre o nada e o tudo, as horas registradas pelos ponteiros embalados do relógio central da estação avançam e aos poucos o ritmo do ambiente se enlerdesse; agora os intervalos entre os metros são maiores e poucos são os usuários que o esperam visto que a cidade nos pede para se rescostar após meia noite. Restam agora nossos incomuns protagonistas anônimos, trocando em confidência mãos que envolvem os quadris e beijos que aquecem e adormessem os olhos nos acentos tornados privados e emoldurados por duas pilastras de pedra cinza. Um instante depois uma pequena rixa faz levantar o garoto, mal humorado e de jaqueta de couro amarrotada, busca um dos pilares já mencionados para ocupar e recompor um novo quadro com outras cores e intenções não tão claras, desbotando o tema anterior de pura ternura e harmonia. Uma expressão desgostosa descruza as pernas da menina de cabelos morenos, expostas por uma saia de tecido vermelho pouco extensa, para leva-las até seu companheiro amuado e amparado de costas à coluna. Ambos agora, ocultos para quem egressa à plataforma pelo seu extremo oposto. Ela repousa ao seu lado e esperam juntos o próximo comboio, quem sabe tardará mais ou quiça nem tanto, mantêem-se em silêncio de igual maneira. Em um roupante ela se volta a sua frente e lhe pergunta: "vc vai ficar assim?" Oprimindo-lhe a resposta com largo e demorado beijo, devorando sua boca e comprimindo-lhe o rosto e o corpo contra o concreto. Alisando-lhe o tronco com as próprias partes do corpo, criando-lhe volume no interior da calça com a própria virília e prontamente o cobrindo com a mão que prega entre suas pernas. Aquele êxtase e sanha ainda completamente estranhos estavam ali para satisfazê-lo; seus olhos abertos nos raros intervalos permitidos denunciavam sua insaciez e loucura. Os corpos alí indivisiveis ardiam e se envolviam nos braços, percorrendo do dorso até as coxas lisas e descobertas, dos glúteos até os seios como tentáculos, coreografia de volúpia e calentura com apenas um fala em seu enredo: "eu quero te chupar!", dita em seu ouvido em voz suave e abafada antes dela arrastar sua línguas nos veios de sua orelha. No momento seguinte, abaixada, seu corpo à altura de seu cinto, abre-o com destreza e saca-lhe o membro para fora, já úmido e latente, seguro entre as duas mãos, massageando e sentindo suas veias ela o engole e o sorve, como se se prova de um doce que não se recusa e apreciando-lhe cada gota em movimentos repetitivos e delirantes! Firme, as mãos dele detidas e emaranhadas até o momento nos cachos de longos fios negros a agarram, jogando seu corpo à sua posição para enfim, deixar em seu controle o ato. Ele a abraça e levanta uma de suas pernas, deslocando a calcinha de seu lugar sacro, penetra-a com o sexo completamente ereto. Ela o sente; o gesto que impele o sexo dele contra o seu em gestos de ir e vir desdobra-se em ondas de excitação e delírio que atravessam todo o seu corpo, cada estocada o insere mais forte e profundamente, gemidos recatados em seu ouvido dão o tom daquele pecado, o tom daquele atrito generoso. A pele e os corpos de ambos vibram e a perna antes escorada sobre um braço agora puxa o quadril como se tal incitação fosse suficiente para partir os limites da carne. O clímax está na expressão de ambos e seu gozo inunda o interior do corpo feminino até então intocado  e se sobressaltando em um grito sufocado apenas pelo ruído do trem que se aproxima. É chegada a hora de recompor-se e tomar enfim o trem de regresso.

sábado, 28 de julho de 2012

Catraca

Absorto em idéias, sigo pelo trajeto habitual até o Metro de São Paulo, minha expressão assume um semblante pesado em razão mesmo dos pensamentos que ocupam a minha mente, meu passo seguro pouco ou nada se detém aos novos e velhos detalhes que assomam à vista daqueles de atenção tadicionamente sensível. O último trecho de asfalto é sucedido pelas escadas que descendem até o sistema de catracas da Estação Jardim São Paulo, antes e enfim uma longa rampa que progride segundo as lei da gravidade de Newton para quem ingressa e egressa. Acesso a uma das roletas de ferro e a trava eletrônicas me barra, sou impedindo de passar alertado pelo ruído de choque metálico e o transe em que levava a minha mente e corpo é temporariamente interrompido, retorno e me fixo sobre o sinal luminoso que informa sobre funcionamento da máquina - está liberada. Em um movimento arisco e desconfiado minha velha jaqueta, presenteada por James Dean em seu filme de 1955, e eu rejeitamos aquele aviso e acionamos a segunda catraca ao lado e nos deparamos com um novo bloqueio. Meu rosto e o das testemunhas anônimas ao redor apontam com um acento de incompreensão. Alguns segundos se passam até me dar conta de que não havia pagado a passagem, saco então o bilhete único da carteira e efetuo o depósito. Cruzo o limite e paro alguns passos a frente para novamente volver os olhos às minhas costa e àquelas dez catraca metálicas enfileiradas para me perguntar: por que tenho que pagar?

quinta-feira, 26 de julho de 2012

Pornopoética, Fragmento 2

Miro com curiosidade seus olhos entre-abertos, deles uma expressão fantasmagórica de delírio parece esfumar, de sua pele lívida parece ter abandonado todo e qualquer viço; dos seus poros uma ou duas gotas de suor brotam. Apenas isso. Então, lhe pergunto "como está?" Vc suspira e segue sondando em meu rosto, talvez, buscando aquilo que pode ter-lhe roubado a vividez. Nus, desabrigados sobre a cama ainda quente, nossos corpos parecem posar um em referência ao outro; apoiando minha cabeça sobre uma das mãos reviso as curvas de um corpo em estado de suspensão. Passo meus olhos sobre os seios ainda enrijecidos, aliso em ascensão seu quadril que se extende ao horizonte de meus dedos à ampla planície de suas coxas. Meu toque de pueril e rastro sutil progressivamente passa a pesar sobre sua pele, minhas mãos que apenas roçavam suas digitais sobre seus glúteos agora desejam agarrar sua carne com mais força e ímpeto. Tomo suas pernas, firmo meus dedos nas regiões contíguas à sua virília cada uma a sua vez, jurisdicionadas pelo seu sexo, aquelas partes ardem cada vez mais e premidas contra as minhas mãos aos poucos alimentam o ânimo de seu vigor. Novamente próximos, embalo sua nuca em meu braço e beijo suavemente seus lábios, alimentando-os com a minha ânsia, embebendo-os em minha saliva. Sua postura, antes quase inerte, reanima mais uma vez a excitação de nossos sexos, regidos por nossas línguas em confronto; elas dão o tom do movimento de cada uma das partes de nossos corpos. Vc entrelaça suas pernas às minhas e naquele momento nossos sexos não estão mais tão distantes um do outro. Comprimidos, úmidos e latentes, eles apenas aspiram a ser tocados e manejados. Refaço o senda anterior e desço mais uma vez àquele rincón entre suas coxas, ali acaricio o seu sexo, afagando cada um desses lábios para enfim invadi-la com meu dedo. Sinto a correspondência de sua boca que todavia esta colada a minha, suas pernas contraindo-se acusam a mesma vibração de quase duas horas atrás. Trago e provo, destilado em minha mão, aquele sabor agridoce como testigo à sua vista. Quase abertos, seus olhos apenas me pedem "não faça isso!". E te ofereço do mesmo gosto que tu provas com insaciez e com ganas de ter de mim uma resposta similar a tua. Fujo do alcance de sua visão e experimento com a língua daquilo que estave em partilha até aquele instante. Sorvo com a mesma ventura aquele fluxo tênue e generoso, nada vejo, apenas sinto suas pernas que impelem meu rosto contra o seu sexo. Sua respiração ofegante substituirá por dias o silêncio do meu quarto vazio. Ali a sua frente, ajoelhado diante de sua mirada, pulsa o sexo do qual faço uso para te penetrar porque assim, ambiciono, de novo, ouvir a sinfonia de seu gozo.

sábado, 21 de julho de 2012

Pornopoética, Fragmento 1

Em um movimento sereno e misterioso ele retira um objeto de sua bolsa, regressa a cama depois da promessa feita sobre a surpresa que lhe havia preparado para esta noite, seguro por uma das mãos trazia um livro consigo, um volume de não muitas páginas, capa marrom, cujo título era bloqueado por dois dos dedos de sua mão. Sobre a cama, usando uma camisola quase translúcida, branca e com abertura na frente ela espera e aguarda com um ar de suspeita e doçura; assentada sobre as próprias pernas e aninhada entre os lençois de tons claros que cobriam a cama ela guarda seu entusiasmo sobre o reinicio da conversa enquanto ele se acomoda a beira do leito ainda distante do seu corpo. Abre o livro e começa sem cerimônia a leitura de uma página que ele sorteou ao acaso. "descoberta de todo pudor e tecido, ela maneja sua nudez como um império, os artificios de sua carne eram empregadas com tal destreza que aquele homem, o qual ela havia eligido para repartir aquela noite, sentia-se quase possuído apesar de empunhar seu sexo já ereto sobre uma das mãos. A malícia e o desejo no rosto daquela sedutora mulher não deixava dúvidas sobre quem dirigia as regras daquele jogo, ela despreza suas mãos em um gesto vulgar e toma ela mesma o grosso e vigoroso brinquedo do seu amante que, desnorteado, não tem mais nada a fazer do que sentir aquelas sucessivas ondas de calor e prazer em seu âmago.." Enquanto lia, sentia que sua companhia limitava as reações a postura do corpo, substituindo uma posição comoda por outra nem tanto, o roçar daqueles finos lençois denunciavam suas respostas contidas. Atento aqueles gestos ele seguiu sua narração até o "delírio irrefreavel daqueles dois amantes anônimos possuía como unica testemunha o ranger desconjuntados da estrutura da cama que os abrigava..". Fecha o livro subitamente e mira com atenção o rosto e o corpo de sua mulher, a devora naquele mesmo segundo de seu olhar, aparentemente inerte ela apenas deseja, arfante de um esforço que ainda não existe, ela segue desejando sem se mover. Então, abandonando o livro a mesa de cabeceira ele se arrasta suavemente sobre a cama até limite físico que permite encaixar sua boca as orelhas dela, à iminência daquele corpo cálido e torna ao fio da seu enredo interrompido, àquele conto de luxúria e devassidão de personagens ficticios, porém dando enfase agora não tanto aos detalhes de sua história e sim à entonação de sua voz e a vibrante correspondencia fisica de sua ouvinte. Ele passa sua língua às bordas da cartilagem, beija com toques suaves de seus lábios o seu dorso nu e o conto pornopoético que nascia não mais daquele livro, pululava sua imaginação e a realidade daquela cama de casal. Suas mãos deslizam pelo dorso dela e sob a camisola, alcançam aquele lugar proibido para todos os outros homens, menos para ele; encontram sua virilia ardente e trêmula, sua mão acaricia o sexo e seus dedos já umidos e ageis criam o prazer daquelas preliminares e o estopim de gemidos sufocados. Seus seios, seu busto, seus ombros, seu olhos todos delatam um prazer que ela intenta prorrogar internamente e infinitamente.. Não existem mais peças de confecção fria sobre seus corpos, nus e libertinos eles incendiam o único cômodo claro da casa. Ela sobre ele, não pode olhar em seus olhos porque aquele prazer e excitação querem ser vistos sem para tanto necessitarem aparência, ele agarrando com ambas as mãos as ancas daquela madonna e puxando e impelindo em movimentos repetitivos o quadril da sua garota, aquele atrito entre os sexos que dura a eternidade do gozo sexual, a petit mort dos ardorosos casais franceses.. Eles não desejam mais nada, apenas descansar por horas, um em referência ao outro, após aquela última comunhão.

segunda-feira, 2 de abril de 2012

A verdade que eu descobri

"La verdad está en el vieje, no en el puerto. No hay más verdad que la búsqueda de la verdad. [...] Aunque estamos mal hechos, no estamos terminados; y es la aventura de cambiar y de cambiarnos la que hace que valga la pena este parpadeo en la historia del universo, este fugaz calorcito entre dos hielos, que nosotros somos."

Toda nossa vida não pode ser refém de uma hstória única, pois esta mesmo não é uma, mas várias, máximas que nascem em palavras tão incertas como as folhas secas que a aragem de outono carrega consigo. Nossa verdade não está exatamente nestas folhas, mas no caminho ao qual a ventania as leva. Somos nômades por natureza e o que faz nossa chama crescer em chispas não é tanto o combustível que arde como o vento que sopra. Abandonamos o deslocamento para viver da segurança e desde o século XVIII nosso pensamento está tingido pela razão. Uma corrente linear que não se abre alternativas e segue um fluxo que nunca se corrompe em direção a um progresso infinito e certo. Abandonamos o deslocamento porque este oferece riscos e não garante a volta, por isso optamos pela convicção cartesiana. Aprendi jovem que a verdade não está nos livros, mas nas pessoas que os escreveram e nas pessoas também que não os escreveram.
Quero gastar meu tempo com as pessoas e não com os livros, quero enredarme em seus mistérios e preencher minha folha branca e vazia como a que John Locke disse que todos nós possuímos. Pois sim, é desta forma que começamos a escreve-la primeiro com as primeiras palavras da socialização com nossos pais e depois com as grandes narrativas de nossos avôs. Como no escrito anterior esta dito, a vida está feita de história, redigidas pelos nossos próprios dias ou emprestadas dos dias de outros, mesclamos esses detalhes em uma composição única que ganha outro alcance a cada nova mirada. Sim, esta é a maior das verdades, a de que não há apenas uma verdade, mas muitas! Complexas, simples, profundas, contraditórias e impossíveis, está verdades estão guardadas nos quatro rincões da Terra esperando apenas um pergunta, uma aproximação ou mero gesto de interesse. Violeta Parra, a chilena mais linda já viva, que tinha feito de sua vida trabalho e amor sabia disso quando lhe perguntaram:

- Violeta, usted es poeta, musica, teje, pinta.. Si yo le doy a eligir uno sólo de estos medios de expresión, cual elegiría usted?
- Yo elegiría quedarme con la gente.
- Renunciarías a todo?
- Es la gente la que me motiva a hacer todas estas cosas.

Não há razão outra para viver se não for pela própria gente, descobrimos isso aos poucos, em contatos instâneos e estranhos na rua ou por longas conversas em dias de reclusão. Torna-se durante a vida uma necessidade o laço mútuo e humano quando antes era apenas uma distração da mesma. Descobri isso em minhas viagens, aos poucos me caiu a ficha de que a verdadeira motivação da minha fuga, que não era fuga e estava mais para busca, era oposta a desculpa que se desprendia de meu discurso. Buscava a gente, viajava pelas pessoas e pela mudança que elas me causavam porque não somos e não podemos ser os mesmo até o fim de nossas vidas.

quarta-feira, 28 de março de 2012

O mundo esta feito de histórias

GOTÁN, Juan Gelman

Esa mujer se parecía a la palabra nunca,
desde la nuca le subía un encanto particular,
una especie de olvido donde guardar los ojos,
esa mujer se me instalaba en el costado izquierdo.

Atención atención yo gritaba atención
pero ella invadía como el amor, como la noche,
las últimas señales que hice para el otoño
se acostaron tranquilas bajo el oleaje de sus
manos.

Dentro de mí estallaron ruidos secos,
caían a pedazos la furia, la tristeza,
la señora llovía dulcemente
sobre mis huesos parados en la soledad.

Cuando se fue yo tiritaba como un condenado,
con un cuchillo brusco me maté,
voy a pasar toda la muerte tendido con su nombre,
él moverá mi boca por la última vez.

O mundo esta feito de histórias, a cada dia ou para ser mais específico a cada par de horas transcorre uma história que alguém a registra, mesmo apenas sobre o tênue tecido da memória, para o resto da vida. Histórias vulgares que ocupam o cotidiano da gente simples, narrações que pelo pecado do descuido seriam jogadas em uma vala comum, deixando sob terra e olvido a riqueza de detalhes observáveis apenas por lente. Desde esse ponto de vista, imagine então, o repertório perdido a cada baixa de nossos parentes mais antigos. São bibliotecas de Alexandria queimadas a cada falecimento de um ancião, já dizia o escritor senegalês Senghor. Uma linha necessita de outras para sustentar um tecido e é no coser diário da nossa vida que descobrimos o encruzilhamento de nossa linha com outras formando um rede infinita de relações. Estariamos flutuando desarraigados se nada não nos prendesse em uma existência única, diversa e coletiva.
Não somos tomados de assombro quando descobrimos conexões ocultas entre papéis velhos ou contos desinteressados? Por um toque do acaso nos es tornado visível um laço a uma trajetória alheia ou um conhecimento antigo ganha nova textura quando novos dados são a ele adicionados. Que alegria é saber que vc estave em minha vida muito antes de eu imaginar te conhecer e igualmente cogitar que eu poderia não existir ou não ser o mesmo se Ariadine não houvesse cometido o favor de nos unir no traçado resoluto de uma agulha. Essa verdade tornou-se real para mim esses dias enquanto lia um poema de Juan Gelman e pinicava a verdade sobre a constituição do mundo, não o mundo de átomos, mas o mundo das pessoas de carne e osso que necessitam tocar-se para saber que estão vivas. Somente existimos, então a partir de uma relação recíproca com o outro, onde este nos faz concreto e tangível esperando uma resposta na mesma moeda.
Esta tudo feito de palavras, de fios verbais que correm e se entrecruzam cargados de mais peso do que quando sairam e desviam de caminho ao encontro de outro para de novo se separarem e formarem cada qual à sua direção um conjunto novo e complexo de desenhos - não claros a vista - mas audíveis a ouvidos pacientes. Por isso embargamos a voz com tanta facilidade, visto que não falamos apenas de nós mesmos quando contamos nossa história, mas de toda uma multidão impercebível que esta ávida por uma audiência. Como se uma narrativa biográfica fosse uma tentativa de desampreder a andar de bicicleta; sendo no início do caminho um passo leve e tranquilo até o fim com muitas quedas sem o saber de mais nada.

quinta-feira, 15 de março de 2012

Km 269


Sob a sorte de uma sombra que amenize o clima de verão levanto o polegar opositor e me ponho a esperar, entre as horas que passam e o desdém deixado pelos carros que me ignoram, a unica mudança na paisagem é a própria sombra a movimentatar-se ao ritmo do sol. Tenho um par de horas antes que anoiteça e eu me torne mais invisível do que estou para os automóveis de viajem ininterrupta. Essa é única certeza e não pode haver muitas quando se esta em meio a estrada pedindo carona, contando com sorte ou com a bondade alheia e a mercê das mesmas condições as quais vc espera receber ajuda. Faz-se isso porque deseja-se, faz-se isso porque não há outra maneira, faz-se isso porque tem-se que fazer; eu o faço para conhecer pessoas e dessa forma contemplo todas as outras respostas.
KM 269 da ruta 10, essa é minha casa, esse é meu mundo enquanto um bom samaritano não desviar meu destino. Preencho meus pulmões com o ar seco destes campos, essa vegetação de pradarias assoma toda a minha vista e não há uma viva alma a não ser um gaucho com seu fatigado cavalo que cruza a estrada. Segundo ele faltam uns bons kms mais para que eu cumpra a minha travessia, se kilometros fossem aqui usados como metafora para a vida, quantos teriam a história daquele homem de bigode grisalho e cabelos ocultos por um chapéu de couro mastigado? Penso nele como uma boa foto que teria guardado aquele instante, carregando com seu antebraço um termo preso junto ao corpo, o mesmo braço que leva o mate a boca e libera o outro para que maneje as rédeas. Diante de tal cenário dou menos atenção aos meus músculos magoados e aprecio aquela cadência distinta das pampas uruguaias, aquele outro tempo que imobiliza a gente e os animais. Falo como estrangeiro de coisas que não sei e que aprenderia somente da voz de um gaucho como o que agora já está embrenhado entre as gramíneis, alimento de rês, alimento, por isso, de gente também. Sou parte da paisagem, diria quem passa, mas prefiro pensar que ela é que é parte de mim porque estou de passagem.
Levo comigo não apenas a flor recolhida em um rincão da estrada, levo comigo também a pessoa que agora divide seu olhar entre a via e o meu. Levo na memória um pouco do veículo que me dirá algum dia muito de seu proprietário. Cada palavra sua é digna de nota, pois não pode-se ignorar quem te abre as portas da casa ou te levada da estrada. Não há limites para essa relação, ela depende apenas do tempo, como igual depende o hacer dedo em um dia de viagem.