sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Adorais aos que morreram!

Como explircar meu apego ao pretérito, este fanatismo quase obsessivo por aqueles que já não estão mais comigo? Um afeto terno devotado a pessoas e momentos mortos; terá alguma causa ou justificativa plausíveis em tempos que a apelação material sobrepõe-se a elevação do espírito? Talvez minha fixação tenha relação com o plano infernal das vontades não atendidas, aonde o único modo de satisfazê-las estivesse orientado a instantes passados em que elas foram saciadas ou à fantasias de pleno gozo dos meus desejo mais íntimos! Dois caminhos prováveis se levarmos em consideração que ambos são alimentados pela minha memóra - faculdade que não sabe mais a diferença entre realidade e imaginação. Pois, então estarei tão afastado assim do meu nirvana pessoal? Minha afinidade aos mortos terá natureza tão simplória? Penso que não.
A dedicação expressada em meus verso, minhas cartas e desenhos não se refere às pessoas pura e simplesmentes, seres de carne e osso, tão voluveis como o nível do mar. Acredito mesmo que minha veneração a certos fantasmas - reflexos de um tempo que não volta por mais que eu clame - esteja dirigida na verdade às minhas reminiscências, bastiões imaculados da minha persistência em viver. Minhas memórias são de fato, não uma dádiva concedida pelo Olympo ou um tesouro poupado com anos de sovinice, mas o que me sobrou, aquilo que eu verdadeiramente tenho. Sabe, uma vida de 40 anos reserva alguns minutos de intenso brilho e outras tantas horas de extensa agonia, uma multidão de conhecidos e desconhecidos, seres que marcarão presença por atos falhos ou passagens de extrema significância, como aquelas primeiras vezes... Porém por dadas circunstâncias, incongruências do percurso ou do próprio discurso nos vemos afastados; separações que provocam dores lacinantes e intermitentes. Estaremos no fim da linha? O que será de mim quando não puder mais abrir esta janela que afronta minha vista com fronda de tão verdejante beleza? Meu amor reside sobre as pequenas coisas, entre elas, minhas lembraças, principalmente as mais latentes e pitorescas, detalhes deste quadro confuso e problemático que é o meu inconciente. Logo, aquela veneração não corresponde mais áquilo que está vivo, mas apenas ao que morreu e foi absorvido pelos meus poros.
A carne apodresse, a aragem varre as folhas secas do jardim, os laços se desvencilham e o amor náufraga em mentiras e promessas - então a que devo confiar meus sentidos? Posso comprometer as estruturas do meu edifício moral com material tão vagabundo?! Minhas recordações são eternas e inalienáveis, material bruto que compôs alma e corpo. Perduraram neste palimpseto mental histórias que comoverão as alianças mais longevas, motivarão os cavaleiros mais leoninos e salvarão os gênios mais corruptos! Se em mim elas tem apenas algumas décadas a mais, nestas páginas elas duraram para sempre.

[...]

Começo a pensar que este blog é o último laço que nos une...

sábado, 17 de outubro de 2009

Geração Cimento

Quem nos disse que a terra daria tudo que pedissemos esqueceu de perguntar ao céu as condições que ele colocava; prometeu aos homens que um novo império seria erguido às custas da natureza domesticada e convenceu as árvores de que elas não seriam prejudicadas; sufocou a terra com pedra e mármore para sustentar a civilização que aflorava, esta,- independente da vida - cortou o cordão umbilical de sua mãe e declarou-se onipontente, onisciente e desta forma, lançou-se em busca da onipresença. Estaremos nos quatro cantos do planeta, bradava a voz que conquistaria os selvagens e daria a nova ordem. Prefácio da ruína que condenaria os homens à adverdidade.
As idéias, não sendo mais de uma base orgânica, prometiam uma relação mais intensa com o ambiente e por isso superficial, seria o contrato artificial que regiria a pós-modernidade. O advento que uniria os homens contra seus pares, contra seus pais, promoveria o ideal da autonomotividade. Logo, não teríamos mais o que aprender com nossas origens, seríamos lobotomizados pelo bem da humanidade, um fim que nos relacionaria intimamente com o produto da nossa inventividade: a máquina. Não falo de substituição, meu temor maior é assimilação! Perdemos nossas raízes a partir do momento que nos afastamos da terra que afagava nossos pés, nos entregamos ao concreto como aquele que se lança ao pecado de sua amante. Pois não foram as árvores e os minerais que nos proveram das necessidades de nossos primeiros anos de existência? Nos gestaram a partir do pó e da lama, nos amamentaram com seiva e água, nos protegeram da ganância e da dor para que sentissemos a liberdade de seu seio e a fartura de seu leito; com o que retribuímos tamanha generosidade?
A geração cimento agora deita às ruas de asfalto os doces versos ninados pelo vento, para lançar impropérios contra os tempos! Descontentes com o presente, não sabem mais retornar à essência da maternidade... Ignorando as súplicas das árvores órfãs da cidade, mantém-se alheios a sua própria e inata vontade, seremos cegos até quando para ignorar essa verdade? Somos a imagem e semelhança das flores - filhos rebeldes - que se negam a retornar a primal casa das primeiras leis e das primeiras autoridades.

Obedeçam às pedras, então!
Rolem em avalanche.

domingo, 11 de outubro de 2009

Sobre a culpa

Culpa, peso que verga nossas espinhas e consome nossos interiores até talhar aquele vazio característico, pensando nessa mancha moral tão deletéria, me propus a desenvolver o conceito deste encargo que tolhe nossa felicidade e é inerente a natureza da humanidade. Este sentimento perveso, avesso ao orgulho e a austeridade, prende a todos em grilhões que nós mesmos concebemos, nascemos então com a estigma dessa culpa natural que deve nos afiançar em comportamentos de piedade e expiação. Como podemos então alcançar a felicidade, objetivo primeiro ambicionado pelo homem, se colocamos-nos como desmerecedores desta dádiva?
Colocando a questão sobre o prisma da coletividade, a conciência de culpa prevalesse através dos discursos que somos forçados a ingerir, seja em âmbito privado ou público, nos deparamos com procedimentos pré-fixados que devem ser seguidos sob pena do desregramento e da ilegalidade. Homilias, sejam oficiais ou institucional, nos conduzem por caminhos moldados pela culpa de obrigações não atendidas ou respeitadas, falo, claro, não só mas, principalmente do dever cívico e da cristianistas caritas que exigem da sociedade algo como uma penitência a ser cumprida por crimes nunca cometidos. Afinal, o pecado original, seja qual for a corporificação mitológica que assuma, não trata-se apenas de uma construção? Construção esta que levantada por interesses e intenções definidas não serviam a um fim prático? Não estou julgando, estou constatando. E o contrato social, não (só) o de Rousseau mas, aquele afixado na praça central, não deveria ser cumprido visando a uma ordem pública? Vivemos então, dentro uma ordenação que lança mão do conceito de culpa para racionalizar os seus princípios.
A solidariedade humana, logo, dentro dessa lógica, não pode ser encarada como propensão primal do individuo, mas apenas como preceito consuetudinário, conduta transmitida pela tradição ocidental cristã. Então, a que eu devo deduzir a indiferença geral ao próximo? Este subproduto indesejado que se dissemina por todo este grande organismo societário é resultado, a meu ver, do cancro maligno do capitalismo que corrompe o organismo por dentro! Assim, o indivíduo naturalmente mal é pervetido por esta moral abjeta e indizível do individualismo arrivista. Desta forma, abandonar a um irmão a própria sorte, renegado ao concreto frio e cinzento da poeira de escapamentos, quando este sofre e sangra, passa a atitude comum a ser tomada.

Esta crítica não é dirigida a sociedade ou ao indivíduo, ela tem como destino certo a minha própria pessoa, sou um subproduto, sou um ser manipulável, sou um espécime da raça humana.

sábado, 10 de outubro de 2009

O que os sonhos podem trazer

Uma pena adejante sobre o ar, um pincel e um leve tracejar infinito e efêmero - aonde um beijo raso pode nos levar? É a deriva destas linhas e pontos que eu espero o que esta pintura me trará, serei tragado por essas cores púrpuras ou apenas iluminado com o reflexo de suas luzes? Às vezes posso enxergar bem longe - mesmo quando não necessário - alço a vista para o horizonte e me hipnotizo por alguns segundos nestes diáfanos tons, quando simplesmente precisaria pôr os olhos aonde as minhas raízes estão fincadas... minhas folhas e pétalas viajaram à grandes distâncias, levadas pela aragem do meu pensamento elas puderam conhecer outras paragens, mas como filhas deste solo sempre souberam retornar. Fecho meus olhos por um instante - envolvido por esta inebriante brisa - aonde estarei quando voltar a abri-los? O tempo aqui não existe e, é sempre noite e é sempre dia, eu só preciso desejar que o desenho corporificado por este traçado me concederá. Se tudo isto é um sonho, então me digas, por que não consigo acordar?
Já me contaram muitas mentiras e em todas creditei minha confiança, porque sabia desesperadamente que flutuar no ar não me levaria a nenhum lugar. Pois aqui estou, no alto deste belveder, com os braços estendidos querendo voar. Não sei mais se é a terra que me protege ou o vento que me engradesse, tenho apenas a certeza de que voltarei a te encontrar; vc ainda não me conhece, é verdade... talvez se quer exista, afinal este é um sonho ou a minha relidade. Estes galhos que pendem sobre o ar não pretendem te dizer adeus, unicamente são meus artifícios para te fazer regressar, são como os outros que penetram sob o campo e estabelecem vínculos com todos os lugares, porque todos estes são partes integregantes e importantes de mim, é o que esta narrativa confidencia. O que eu sou no alto desta serrania com uma pena na mão e com tanta sede na garganta? São perguntas que sompram e anuviam as minhas retinas...
Mas, e esta melodia que ouço desde o instante que fechei os olhos, de que me serve? São os pássaros que estão cantado, o riacho que está correndo ou somente as crianças brincando? Não, é uma sinfonia e eu estou aprendendo a ouvir e decifrar, este deverá ser meu triunfo no meu lar, meu guia que apita e zumbi no ar-ar-ar.

Ah, como é bom te escutar...

domingo, 4 de outubro de 2009

21 de outubro de 1492

"Acho que voltamos ao Paraíso. Certamento, o mundo era assim no início dos tempos. Se os nativos tiverem de ser como nós que seja por meio da persuasão, e não da força. Nunca se verá o que vimos nesta terra pela primeira vez. Viemos em paz e com princípios. Não são selvagens, e também não seremos. Trate-os como faria com sua esposa ou filhos. Respeite sua crença. O furto será punico com chicote, o estupro, com a espada."

Os homens andam nus e as mulheres não tem preocupação em esconder suas vergonhas, uma criança é filha de toda a comunidade e não apenas responsabilidade de um casal. Aqui, a única ambição é o respeito, reconhecimento pelo bem comum que um destes filhos da aldeia se esforçou para oferecer a sua grande família. Não existem contendas, não existem desavenças, não existem diferenças entre a solidariedade e ações da vida cotidiana. Quem aqui chegar reconhecerá o paraíso ou o inverso do mundo ao qual ele não desejará mais regressar. Desejar corromper a pureza destes costumes será o maior de nossos pecados!
A simbiose entre os filhos desta cultura e a natureza é total, da terra retiram os frutos que suas necessidades solicitam, não usufruem mais do que precisam pois, assim sabem que sempre o terão. Em que momento, a partir de qual encruzilhada perdemos o rumos da sabedoria primal a qual estes homens parecem nunca ter se afastado? Saberemos retornar para nossas mulheres e filhos, através do oceano, e transmitir esta tradição? A candura e a bondade deve nos contagiar, mas temo que este quadro que pinto para os olhos incrédulos de Sua Majestade possa se perder, resistindo somente em nossa memória.
Encontramos, não imaginaríamos, com nossos irmãos nesta terra de imponente e exuberante belzeza, o calor e afago de sua recepção nos impressionaram e comoveram mais a mim do que a qualquer outro. Sinto que temos muito mais a aprender do que a ensinar, a Glória de Deus que trouxemos em nossas flâmulas e crucifixos devia a muito tempo antes ser conhecida por eles do que quando nos foi transmitida. Deus aqui, está em cada pedra, em cada riacho, em cada árvore - nelas, nossos anfitriões as escalam como as abraçariam, foi dela que subtrariam sua visão de mundo. Estes homens são filhos das árvores.

Abro minha janela,...


... meu amparo, meu sustento, as raízes fincadas na terra e no concreto dão a base para meu lamento; não te condeno a servidão dos meus sentidos, teu destino é crescer e tomar as estrelas, pois se da matéria morta te alimentastes não será o céu o limite de tuas hastes. E seus vasos, onde percorrem a seiva da tua intensidade, me estimulam a produzir o libido de minhas vontades pois, por vc sou todo encantos e devoção, não há na Terra tamanha força que me traga maior vertigem ou libação. Dignidade em cada folha, exuberância em cada flor, será apenas o vigor dos nutrientes e minerais que te elevam de todo este horror? A vc, cedo todos os meus segredos para depois me curvar diante de seus ensinamentos, não penso que somente palavras provarão meu acatamento, acho antes que a água que entorno em seu solo lhe oferecerá melhor acalento.

Não tens nome, não tens espécie; não te encontraram função produtiva ou valorizativa.. tens apenas o frescor e a punjância de um fruto após a primavera.